Lembrava quase sempre do mesmo momento. As mãos frágeis e nervosas, o cheiro do cabelo, uma cor no céu que não compreendia. Ruminava o que se esforçava por não lembrar, mas sonhos assim têm direção e força. Decolam sozinhos, alcançam mais longe. Ignoram o pouso.
Levantou, fingiu passos ou imaginou andar. Ainda suava o mesmo tremor. Ainda imaginava as perguntas, ansiava respostas, onde esconder as mãos, aquelas mãos. Olhou os dedos com toda calma, para cada detalhe dedicava dias, cada linha e traço da pele guardando um universo. Da vastidão do polegar lançou o olhar ao aparelho.
Indagação ao reflexo. Silêncio. Não fosse ainda a mesma lembrança encerraria o dia ali. Era, ainda então, mais forte a imagem. Agarrou o telefone com a imensidão de suas mãos. Com a boca seca, aranhou entre os dentes o “alô” sussurrado.
Em todas as gerações, vidas nascidas e findas que criavam moradas entre o som de sua voz e a voz dela, abismos entre guerras e vitórias, seus olhos cerrados esperavam.
Ainda lhe restava o cheiro do cabelo.
Nossa! Eu não sei se já te falei isso, mas essa última frase me dá um soco no estômago… sempre perco o ar por uns segundos quando leio…
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